O relacionamento entre indústria e varejo passa por um novo momento, no qual mais uma revolução, dessa vez não tão silenciosa, está acontecendo. De ruidosa e desconfiada, a relação deve evoluir para um modelo de trabalhos cooperados, seja vertical, seja horizontalmente, para buscar diferenciação, eficiência e a fidelidade do shopper.
Ainda que soe como utópica para muitos, uma relação baseada na confiança e transparência está se tornando imperativa. Diante desse contexto, nasce a ideia do varejista como integrador.
A visão é a seguinte: se o varejo se percebe recebendo a visita de consumidores interessados na aquisição de produtos capazes de atender às suas necessidades, e alguém tem uma indústria que fabrica esses produtos, esses personagens são “aliados” naturais em potencial, e as possíveis adversidades na relação dos dois é fruto de uma distorção da natureza e objetivos dos seus negócios, que deve ser minimizada em vista de um ganho recíproco.
Impraticável para muitos, essa postura já é adotada entre as principais redes e seus fornecedores-chave em mercados mais evoluídos, como nos EUA e na Europa. Para obter máxima eficiência no atendimento às demandas dos consumidores, inúmeros modelos de integração estão sendo implementados, viabilizados graças a recursos tecnológicos até pouco tempo impensáveis.
Entre os principais modelos de integração, destacam-se:
– EDI (Eletronic Data Interchange – Transferência Eletrônica de Informações)
A automação do setor supermercadista, acelerada a partir da década de 90, trouxe uma série de evoluções que possibilitaram ao varejo uma maior aproximação com seus fornecedores.
Entre esses modelos de integração a partir de plataformas tecnológicas, destaca-se o EDI, uma ferramenta de troca eletrônica de informações entre a indústria e seu revendedor, atacadista ou varejista.
O principal beneficio é a transmissão eletrônica de pedidos, possibilitando uma redução no tempo entre o envio do pedido e a entrega da mercadoria, minimizando a possibilidade de erros e reduzindo custos.
– ECR (Efficient Consumer Response – Resposta Eficiente ao Consumidor)
A ECR é um movimento integrador, iniciado na indústria, envolvendo toda a cadeia de produção e distribuição com o objetivo de melhorar a eficiência na distribuição de produtos.
Baseado no principio de que toda a cadeia deve se organizar para atender a demanda da ponta (ou seja, do shopper), o ECR propicia as seguintes vantagens: redução dos estoques de todo o sistema, promoções de produtos mais eficientes e introdução eficiente de produtos. Para atacadistas e varejistas, oferece melhor fluxo de caixa, maior eficiência dos estoques e redução dos custos administrativos. Para a indústria, propicia maior eficiência da produção, melhor gerenciamento do inventário e melhor eficiência de promoção.
Tanto o EDI quanto o ECR se encontram em processo de evolução, porém sua implementação se tornará uma grande aliada tanto da indústria quanto dos varejistas e distribuidores, permitindo uma aproximação entre as mercadorias e os serviços entregues conjuntamente por esses canais de venda na perspectiva de demanda cada vez mais apurada e sofisticada dos consumidores.
– GC (Gerenciamento por Categorias)
O Gerenciamento por Categorias tem como objetivo ordenar exposição, sortimento e merchandising de modo a propiciar ao shopper uma solução completa para suas necessidades. Mais do que um arranjo ou uma ambientação de gôndolas, o GC possibilita ao cliente encontrar com naturalidade o que procura, obedecendo sua lógica de compras. Para tanto, é preciso responder a perguntas como as seguintes: 1. Qual a necessidade do shopper? 2. Quais produtos oferecem uma solução para essa necessidade? 3. Quais produtos podem ser vistos como inter-relacionados ou substituíveis? 4.Quais atributos, por ordem decrescente, têm maior peso na decisão? Partindo dessas definições, centradas no entendimento das necessidades do shopper, indústria e varejo elaboram um plano conjunto que deverá ser implementado, testado, revisado e ajustado.
A implementação do GC contribuiu para a redução de rupturas, a melhoria na rentabilidade da categoria em função da venda de itens de maior valor agregado, o aumento da compra por impulso e, o mais importante, o aumento da satisfação do cliente.
Pela ótica financeira, para gerir uma categoria é preciso mapear a venda dos itens, individualmente e em grupo, conhecendo suas margens de contribuição. Tal conhecimento ajudará o gestor da categoria nas prioridades envolvendo exposição, gerenciamento de compras e formação de estoques.
No momento em que é iniciado o GC, tais atividades são delegadas ao “capitão da categoria”, ou seja, um fabricante que tenha acesso aos dados do varejista e preste esse serviço por sua conta e risco. O beneficio alcançado trará ganhos não apenas ao capitão, mas em especial ao varejo e, ainda que de forma contraditória, aos demais fabricantes que compõem a categoria, que por sua vez concorrem diretamente com o capitão.
O Gerenciamento por Categorias ainda é uma atividade incipiente, que gera controvérsias. São poucos os exemplos em que sua implementação segue à risca a cartilha, devido às influências e aos interesses comerciais que acabam permeando o processo.
Na maior parte dos casos, a prática de GC envolve tão somente acordos de adequações de planograma, definidos pelo capitão de categoria em prol de seus interesses, contribuindo para uma utilização aquém de seu real potencial. Àqueles que desejam implementar o GC da forma completa, a figura abaixo apresenta a metodologia completa:
Eu explico mais sobre Gerenciamento por Categorias neste vídeo.
– EPC/ RFID (Etiqueta de radiofrequência)
A maior e mais marcante de todas as mudanças será sem dúvida a revolução promovida pela adoção do código eletrônico de produto (EPC), conhecido também como etiqueta inteligente. Ela substituirá o código de barras, utilizando a tecnologia de identificação por radiofrequência (RFID).
Essa será a grande mudança no conceito de identificação de produtos e trocas de informações dentro da cadeia de suprimentos, e especialmente dentro do varejo. Os principais benefícios desse sistema são:
- Automação: redução de processos manuais, como captura de dados, minimizando o erro humano e permitindo que os funcionários se dediquem a atividades de maior valor agregado.
- Integridade: possibilidade de manter as informações atualizadas em tempo real, eliminando erros, facilitando o rastreamento e prevenindo perdas e roubos.
- Velocidade: redução do tempo de movimentação de materiais e busca de informações.
- Informação: disponibilidade de dados e informações que permitam uma tomada de decisão melhor e mais rápida.
- Capacidade: permite às empresas explorar novas aplicações em sua cadeia de suprimentos, melhorar o atendimento ao cliente e o relacionamento com os parceiros da cadeia.
O desenvolvimento desse sistema exige um trabalho conjunto entre as indústrias e as redes de varejo, e já está sendo testado, de forma incipiente, tanto no Brasil quanto no exterior.
Ainda que os sistemas e as metodologias cima apresentados já sejam adotados por alguns fabricantes e redes varejistas, exemplos de integração plena são exceções. Quando ocorrem, estão restritos a grandes fabricantes e redes mundiais. As principais barreiras são falta de cultura de integração e gargalos na infraestrutura tecnológica, sendo a questão cultural o maior desafio.
Texto adaptado do livro Planejamento de Trade Marketing – o domínio do canal de vendas